quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Musicoterapia melhora qualidade de vida das crianças com paralisia cerebral

Não se trata de conseguir uma recuperação total, mas sim de melhorar a qualidade de vida das crianças e jovens com paralisia cerebral. Com esta frase consegue-se reunir a ideia central das "Primeiras Jornadas Ibéricas da Musicoterapia" que começou hoje na Universidade do Algarve (UALg) e termina neste sábado, dia 25 de Maio.

"O que um musicoterapeuta faz é que com a utilização de um instrumento musical, a criança consiga realizar outras actividades do seu dia-a-dia", disse Gabriela Rodríguez de Gil, licenciada argentina em Musicoterapia. Algo que para uma pessoa normal pode ser tão simples como levar um copo de água à boca ou poder comunicar-se, mas que para estas crianças não o é, através do uso de instrumentos musicais eles começam a fazê-lo, garantiu a musicoterapeuta. Segundo esta especialista, que trabalha desde 1999 no Núcleo Regional de Faro da Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral (APPC), a música pode actuar como facilitadora dos movimentos: ao ajudar a planificar, programar e executar sequências; na sincronização rítmica e na facilitação audioespinal, na medida em que os sons activam o Sistema Nervoso Central e produzem respostas motoras. Além disso, a utilização de instrumentos adaptados às crianças e jovens com paralisia cerebral aumenta a sua auto-estima, tanto nas suas produções vocais como instrumentais, "pondo o olhar na interacção de grupo, a partilha e a demonstração de suas emoções, mais que na perfeição de suas produções", referiu.

Segundo a musicoterapeuta, o que a Musicoterapia pretende descobrir e conseguir é se a criança sabe cantar, se entende a música, se acompanha a canção, se é capaz de bater em coisas com a intenção de tocar (embora não ao ritmo certo), se consegue dançar, entre outras coisas. Métodos de intervenção O Núcleo Regional de Faro da APPC atende, actualmente, a 300 crianças e jovens com paralisia cerebral e atraso de desenvolvimento. Tem a funcionar cinco valências: intervenção precoce, escola de educação especial, centro de actividades ocupacionais, formação profissional e ambulatórios. Contudo, a Musicoterapia só dá resposta a 80, visto que esta terapia começou a ser utilizada na APPC somente em 1999. Os métodos de intervenção mais utilizados neste caso são a estimulação auditiva rítmica, o apoio sensorial de padrões de movimento e tocar instrumentos musicais terapeuticamente. Dos utentes que utilizam a Musicoterapia, 80 por cento sofrem de multideficiências com grande incapacidade motora, 15 por cento têm menor incapacidade motora e 5 por cento alteração de comportamento. No caso do primeiro grupo, a estratégia para combater a pouca verbalização foi a utilização de cadernos de comunicação e identificação de canções. Já para melhorar a incapacidade motora, recorreu-se, de imediato, ao uso de instrumentos musicais. "Como em muitos casos era preciso um contacto mais individual com a criança, acabou-se criando a 'Sala de Instrumentos de Musicoterapia", revelou Gabriela Gil. Normalmente, uma sessão de Musicoterapia dura entre 30 a 45 minutos. Pode ser feita uma ou duas vezes por semana. Em ambas situações, a escolha acaba dependendo da situação em que se encontra cada criança. Contudo, o tempo total do tratamento (e a resposta ao mesmo) é muito variável. Na sua exposição, a musicoterapeuta falou de um caso específico de uma menina chamada Anaís. Chegou ao APPC com pouco mais de três anos. Hoje tem seis, mas "só começou a responder, efectivamente, a terapia desde o ano passado; às vezes, para que alguns consigam ter uma sincronização ou coordenação de um instrumento levam um ano, enquanto outros respondem mais rapidamente", expressou.

Paralisia cerebral Trata-se de uma situação originada por lesão no cérebro, que se manifesta, principalmente, por perturbações do controlo da postura e do movimento, às quais se associam, muitas vezes, perturbações da linguagem, deficiências sensoriais e de percepção, problemas de comportamento e epilepsia. Segundo Carlos Machado, médico fisiatra do HDF e membro do N.R. de Faro da APPC, quando se fala em identificação das necessidades na reabilitação das crianças com alterações neurológicas, "não é possível continuar fazendo-o tendo em conta, unicamente, as suas deficiências", defendeu na sua intervenção durante as jornadas.

Para este especialista, quando se entra em contacto com um miúdo deste tipo é preciso fazer uma avaliação qualitativa do seu desempenho, enfim, daquilo que ele consegue fazer. Tal procedimento "nos permite fazer, por um lado, um (re)conhecimento da criança e, por outro, este instrumento acaba por funcionar, positivamente, no contacto deste ser com o seu meio". Foi por essa razão que o fisiatra criticou o facto que os testes que existem ainda hoje estejam equivocados porque foram criados para diagnosticar uma grande população e, por isso, "não conseguem dar uma resposta completa das crianças que têm problemas motores e cognitivos", enfatizou. O procedimento normal da avaliação das necessidades na reabilitação das crianças com alterações neurológicas apresenta várias etapas: capacidade de manutenção tónica, organização postural, irritabilidade, capacidades de habituação e de apaziguamento e nível global de actividade.

Entretanto, "o primeiro passo é sempre começar pela normalização tónica e do padrão postural", assegurou o médico. Portanto, o que a reabilitação pediátrica pretende fazer é, a partir da análise e do conhecimento dos padrões e esquemas de funcionamento normal, inibir o aparecimento ou a instalação de padrões pervasivos para o desenvolvimento da criança e facilitar a experiência e integração de regras normalizantes nos esquemas comportamentais do miúdo.

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